E é todo dia a
mesma rotina, aquele despertar cansado, cheio de sono, aquela vontade imensa de
ficar na cama, quietinha curtindo aquele momento puro e tranquilo de solidão. É
o único momento em que ela realmente gosta de estar sozinha. Onde moram os
desejos proibidos, os sonhos inalcançáveis, aquela vontade de voltar ao passado
e refazer tudo, tudo diferente.
Todo dia se repete
é a maquiagem no rosto, aquela arrumadinha no cabelo, toma correndo uma
vitamina e sai pra enfrentar toda aquela loucura na tentativa de chegar ao
trabalho, tenta pensar diariamente que existem pessoas em pior situação, que
sofrem o dobro nos transportes públicos maravilhosos daquela cidade, dai vem às
forças pra suportar a multidão, o calor e as trezentas esbarradas que leva.
Tenta ler um livro,
as linhas se embaralham um pouco com o chacoalhar do trem, hora se perde porque
alguém quis passar e quase levou o livro embora, hora se concentra e quase
perde a estação.
Carrega no peito
tantos sonhos, uma vontade intrigante de mudar, como se tivesse certeza que
algo nessa vida a espera, se sente presa naquela falta de coragem, naquele medo
de arriscar. Lamenta sua vida chata e esbraveja pra si mesma, “tenha coragem
menina, o tempo passa e a gente nem vê”.
O mundo lá fora às
vezes parece doce, outrora amargo. A vida de cada um se confunde naquele vai e
vem de pessoas se atropelando pra chegar a algum lugar e começa a pensar se
toda aquela multidão carrega um sentido na alma pra levantar todo dia de manha.
O jardim do vizinho sempre parece mais florido que o nosso, mas você nem sabe
qual é a luta daquele cara de camisa amassada que esta ali correndo segurando a
mochila pra não perder aquele vagão, se não for nesse ele perde a hora, e ai,
quem sabe?
Da vontade de
fugir, tentar morar em outro país, mas a vida já mudou tanto que não cabe mais
esse sonho na bagagem, agora é tudo diferente, quer constituir família, quer
ver um ser pequenino a chamando de mãe, quer ter pra onde voltar todos os dias
e quer ter alguém a sua espera.
Tem medo do futuro,
mas deseja imensamente que ele vá chegando devagar, que seja leve e ao mesmo significativo,
que traga as mudanças que ela tanto sonha, que traga as realizações daqueles
pensamentos diários a caminho do que hoje ela acha tão “nada”.